Perdoando o inevitável clichê, devemos reconhecer que o Carnaval da Bahia não seria o mesmo se não fosse por Daniela Mercury. Talvez depois dela também houve artistas de axé que ganharam mais projeção e popularidade do que ela, mas quando ela estourou com o álbum e a música homônima O Canto da Cidade, em 1992, houve uma revolução no carnaval e na indústria fonográfica baiana , que dominaria o rádio e a TV naquela década.
Por isso, é justo que ela celebre os 30 anos desse clássico e os 40 do trio elétrico, com toda a pompa, já que começou como backing vocal e passou pela Banda Eva e Companhia Clic, como vocalista. .
“Os jovens veem Daniela considerada a rainha do Axé e às vezes não entendem o porquê. Eles se perguntam por que não é Ivete ou Claudia Leitte… O problema é que as pessoas esquecem ou não conhecem a história!” Em tom indignado, o dançarino André Ortins, fã de Daniela, que se preparou nesta terça-feira de carnaval, esperando o último dia de pipoca da cantora, em Campo Grande.
Ortins, como dezenas de outros fãs, usava uma camiseta com a foto de Daniela. Na imagem, a cantora estava usando luvas — uma vermelha e outra azul — como as que usou na capa de O Canto da Cidade.
Independência
Como de costume, Daniela escolheu um tema para a festa deste ano e mergulhou de cabeça. Desta vez, ele homenageou os 200 anos da Independência do Brasil e destacou a importância das mulheres que participaram da Independência da Bahia, como Maria Felipa, Joana Angélica e Maria Quitéria. De vez em quando parava para dar uma aula de história e feminismo, com seus discursos de sempre — importantes e necessários, para esta repórter, mas supérfluos para tantos foliões.
Os queridinhos Gil Passos e Ricky Brito exibem as luvas que usaram em homenagem a Daniela (foto: Roberto Midlej/CORREIO) |
Mas, é verdade, um prato cheio para quem gosta de criticá-la. “Daniela fala quando quer discutir. Por exemplo, para falar sobre democracia e diversidade. Muitos amigos falam que ela é chata por causa disso. Mas eu acho o contrário”, defende o torcedor André.
Sobre a defesa da democracia, Ortins tem razão: provavelmente foi a palavra que o cantor mais repetiu naquela parte inicial do cortejo, antes de entrar na região do Forte São Pedro. “Depois de saber, o susto que tivemos, vamos garantir a democracia”, foi uma de suas frases logo após o início da apresentação, por volta das 15h15 – um atraso de mais de duas horas, como todas as outras atrações.
Preocupada com o assédio às mulheres no Carnaval, ela fala sobre isso ao ver o movimento Respeite a Mina na avenida: “Pode paquerar, mas não venha me pegar! capoeira”, protestou o cantor, em tom bom e sério. E assim continuou, com seu tom político de sempre: falou de respeito ao meio ambiente, trabalho escravo e orgulho de ser baiano, em referência à xenofobia contra os nordestinos : “Salve o Nordeste! A gente só faz barcanada por lá.”
Músicas
“Tudo bem, mas tinha música?”, o leitor vai perguntar neste momento. Sim, Daniela cantou muitos de seus clássicos e também novos, como Macunaíma e Soteropolitanamente na Moral, de seu mais recente álbum. Este último atraiu apenas o público mais fiel da cantora, mas foi quando ela cantou os backing vocals de clássicos como O Canto da Cidade e O Mais Belo dos Belos que o público realmente ficou viciado.
Para quem está de fora, ao observar Daniela andando pela Avenida, talvez a impressão seja de uma atuação morna ou irregular, excessivamente interrompida pelas falas da cantora. Mas o que dizer aos fãs, que a acompanharam nestes seis dias de Carnaval, diariamente na sua pipoca ou crocodilo? Eles estão encantados, se divertem muito e não ligam para essas críticas ao suposto comprometimento excessivo da cantora.
De fato, para muitos deles, é uma virtude do artista. E, se no Carnaval se prega tanta diversidade, essa diversidade também deve estar presente no trio: se por um lado há artistas que se afastam das questões políticas – e isso não os torna menos importantes para a festa – por outro outras, felizmente, são as Danielas, que são entradas imprescindíveis para a folia e, mesmo com alguns tropeços aqui ou ali, conseguem revolucionar esta festa.
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